Capitulo 13
Disse-me meu irmão que aquele rapaz era uma inteligência superior, mas depravada pelos maus costumes. A razão por que ele viera a nossa casa era muito simples ; encarregara-o seu pai de falar com meu irmão a respeito da remissão de uns foros.
Vasco passou nesse dia por debaixo das minhas janelas : fixou-me, cortejou-me, corei, e não me atrevi a segui-lo com os olhos, mas segui-o com o coração. Que suprema miséria, Carlos ! Que renúncia tão impensada faz uma mulher da sua tranquilidade.
Voltou um quarto de hora depois : retirei-me, sem querer mostrar-lhe que o percebia ; fiz-me distraída, por entre as cortinas, a contemplar a marcha das nuvens, e das nuvens descia um olhar precipitado sobre aquele indiferente que me fazia corar e sofrer. Viu-me, adivinhou-me, talvez, e cortejou-me ainda. Eu vi o gesto da cortesia, mas fingi-me e não lhe correspondi. Foi isto um heroísmo, não é verdade ? Seria ; mas eu tive remorsos, apenas ele desaparecera, de o tratar tão grosseiramente.
Demorei-me nestas puerilidades, meu amigo, porque não há nada mais grato para nós que a recordação dos últimos instantes de ventura a que se prendem os primeiros instantes da desgraça.
Aquelas linhas fastidiosas são a história da minha tansfiguração. Aí principia a longa noite da minha vida.
Nos dias imediatos, a horas certas, vi sempre este homem. Concebi os perigos da minha fraqueza, e quis ser forte. Resolvi não vê-lo mais : revesti-me de um orgulho digno da minha imodesta superioridade às outras mulheres : sustentei este carácter dois dias ; e, ao terceiro, era fraca como todas as outras.
Eu já não podia divorciar-me da imagem daquele homem, daquelas núpcias infelizes que meu coração contraíra. O meu instinto não era mau ; porque a educação tinha sido boa ; e, não obstante a humildade constante com que sempre sujeitei a minha mãe os meus inocentíssimos desejos, senti-me então, com mágoa minha, rebelde, e capaz de conspirar contra a minha família.



















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