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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Pupila 4°Capitulo

Posted by Anônimo | quinta-feira, setembro 22, 2011

Capitulo 4

Carlos cismava na aplicação da anedota, quando o dominó lhe disse, adivinhando-lhe o pensamento :

- “Não creias que eu seja mulher de nariz de cera, nem me suponhas capaz de assombrar-te com a minha fealdade. A minha modéstia não vai tão longe… Mas, meu pacientíssimo amigo, há em mim um defeito pior que um nariz enorme : não é físico nem moral ; é um defeito repulsivo e repelente : é uma coisa que eu não sei exprimir-te com a linguagem do inferno, que é a única e mais eloquente que eu sei falar, quando me lembro que sou assim defeituosa !”

- “És uma enigma !…” ─ atalhou Carlos, embaraçado, e convencido de que encontrara um tipo maior que os moldes tacanhos da vida romanesca em Portugal.

- “Sou, sou !…” ─ acudiu ela com rapidez ─ “sou aos meus próprios olhos um dominó, um continuado carnaval de lágrimas… Está bom ! Não quero tristezas… Se me tocas na tecla do sentimentalismo, deixo-te. Eu não vim aqui fazer papel de dama dolorida. Soube que estavas aqui, procurei-te, esperei-te mesmo com ansiedade, porque sei que és espirituoso, e podias, sem prejuízo da tua dignidade, ajudar-me a passar algumas horas de ilusão. Fora daqui, tu ficas sendo Carlos, e eu serei sempre uma incógnita muito grata ao seu companheiro. Agora acompanha-me : vamos ao camarote 10 da segunda ordem. Conheces aquela família ?”

- “Não.”

- “É uma gente da província. Não digas tu nada ; deixa-me falar a mim, e verás que não passas mal… É muito orgulho, não achas ?”

- “Não acho, não, minha querida ; mas eu antes queria não desperdiçar estas horas porque fogem. Tu vais falar, mas não é comigo. Sabes que tenho ciúmes de ti ?”

- “Sei que tens ciúmes de mim… Sabes tu que eu tenho um profundo conhecimento do coração humano ? Já vês que não sou a mulher que imaginas, ou quererias que eu fosse. Não comeces a desvanecer-te com uma conquista esperançosa. Faz calar o teu amor-próprio, e emprega a tua vaidade em bloquear com ternuras calculadas uma inocente a quem possas fazer feliz, enquanto a enganas…”

- “Julgas, portanto, que te minto !…”

- “Não julgo, não. Se mentes a alguém é a ti próprio : bem vês que não te creio.. Tempo perdido ! Anda, vem comigo, senão…”

- “Senão.. O quê ?”

- “Senão… Olha.”

E a melindrosa desconhecida largou-lhe o braço com delicadeza, e retirara-se, apertando-lhe a mão.

Carlos, sinceramente comovido, apertou aquela mão, com o frenesi apaixonado de um homem que quer suster a fuga da mulher por quem se mataria.

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